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O que é arte sonora?

O que é arte sonora?

 

 

Trabalho de arte ou música experimental: saiba mais sobre esta linguagem cujo protagonista são as ondas sonoras

Uma característica intrínseca à arte contemporânea é a falta de limite entre linguagens. Performance pode parecer dança ou teatro, videoarte anda de mãos dadas com o cinema, e arte sonora também pode ser chamada de música experimental. Criadores de qualquer um desses grupos buscam experiências artísticas sem se importar com rótulos. No caso da arte sonora, artistas e músicos trabalham a escuta: barulhos, ruídos, sons, fala e música despertam outros tipos de percepção e atenção.

MÚSICA OU ARTE CONTEMPORÂNEA?

 

O Lisboa Soa é um festival anual que mistura arte sonora com urbanismo e cultura auditiva, e tem a ideia de ocupar espaços relacionados à natureza dentro da cidade de Lisboa com instalações sonoras, concertos e performances. Nesse ano, entre 24 e 27 de setembro, a Estufa Fria teve apresentações de Gabriel Ferrandini, que tocava em meios às plantas e árvores produzindo uma trilha sonora que fazia que quem estivesse passeando por lá se sentisse no cenário de um filme distópico.  Do lado de fora da estufa, a dupla Joana Sá (@joana_sa) e Luís Martins tocou piano e guitarra em uma pegada bem experimental quase que dentro do lago do parque.

Foto de capa: a dupla Joana Sá e Luís Martins no Lisboa Soa 2020 (Por Vera Marmelo)
Gabriel Ferrandini na Estufa Fria de Lisboa (Foto: Vera Marmelo)

NÃO SÓ PARA OS OUVIDOS, PARA OS OLHOS TAMBÉM!

 

Uma das apresentações mais incríveis que já vi neste festival foi o português Ricardo Jacinto (@polvolato) – mistura de arquiteto, artista visual e músico – que, em 2018, fez uma performance com um violoncelo, tocando não somente as cordas, mas explorando as vibrações de todo o instrumento com um sistema poderoso de amplificação (veja na foto de capa desta matéria). Como num concerto, a performance dele ali é primordial. Mas, a ideia era explorar o som para além do que estamos acostumados. Às vezes vale fechar os olhos para escutar melhor, outras é necessário dar maior atenção à estética da obra: no caso da performance de Ricardo Jacinto, o reservatório Mãe D’Água das Amoreiras, datado de 1834, tinha um quê de sagrado.

Ricardo Jacinto no Reservatório Mãe d’Água, no Lisboa Soa 2018 (Foto: Julia Flamingo)

INSTALAÇÃO SONORA

 

A arte sonora é sempre um resultado da relação entre a produção de arte e o ambiente. Apesar de seu objeto principal ser imaterial (as ondas sonoras), esse tipo de arte é, em alguma medida, uma ocupação espacial: seja por conta do aparelho que emite o som gravado (uma caixa acústica, uma vitrola), porque uma pessoa apresenta fisicamente uma performance que emite sons, ou quando o trabalho é uma instalação. Este último é o caso da obra “Clams”, de Marco Barotti (@marcobarotti). Também na Estufa Fria, ele fez esculturas em formas de conchas, que convertem dados em tempo real recolhidos por sensores submersos no rio Tejo em sons e vibração. A música gerada pelos moluscos da instalação depende dos níveis de qualidade de água do rio Tejo. Marco tem formação em música, mas vem produzindo esse obras que misturam som e tecnologia para nos fazer lembrar de questões ambientais. E é claro que, tendo a natureza como pauta frequente do seu trabalho, ele faz um elogio aos seus sons – no fundo, ele pede para nos reconectarmos com a natureza.

Instalação sonora “Clams” de Marco Barotti (Foto: Vera Marmelo)

SONORA E SILENCIOSA

 

Melhor exemplo para entender a arte sonora é o trabalho de John Cage, o compositor americano que, em 1952, apresentou 4’33’’. Uma orquestra completa de músicos, segue a partitura com os olhos, passa as páginas com os dedos e agradece ao final do tempo indicado no título do trabalho. Mas de lá, não sai som algum. Cage estava interessado não na música e na orquestra, mas no público e sua reação. Ele queria dar atenção e importância ao silêncio.

 

Esse episódio foi tão inovador na época que vem sendo reproduzido e exaltado por inúmeros artistas em todo o mundo até hoje, como é o caso da portuguesa Joana Gama (@joanamcgama). Ela é uma pianista de renome, mas no vídeo abaixo, vemos que na performance apresentada no Panteon Nacional, em Lisboa, ela não encosta em nenhuma tecla. Pode parecer simples, mas o silêncio vira pertubador e um gatilho de questões: sabemos quando ficar calados? Sabemos ouvir o outro? E damos ouvidos ao que nosso corpo está tentando nos dizer?

QUEM MAIS?

 

A escocesa Susan Philipsz foi o primeiro nome da arte sonora a ganhar o Turner Prize, em 2010 (um dos mais relevantes do mundo, o prêmio condecora um nome britânico anualmente desde 1984). Ela trabalha em cima de musicas como folk e até assinadas por David Bowie para entender de que maneira os sons ativam a memória e as emoções. Em Lowlands, transmitia uma música do século 16 embaixo de pontes, em Glasgow (assista o vídeo abaixo). Surda desde o nascimento, a americana Christine Sun Kim (@chrisumkim) só faz trabalhos cujo protagonista principal é o som ou a falta dele, como Face Opera, “cantada” somente com expressões faciais. No Brasil, o grupo O Grivo cria engenhocas do tamanho de maquetes que, ao funcionarem mecanicamente, produzem ruídos. Essas máquinas são apresentadas como instalações de museus, mas também produzem trilhas sonoras de  filmes, como aqueles produzidos pelo cineasta Cao Guimarães (@caoguimaraes).

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