Por que os trabalhos de vídeo são demorados demais?
Alguns trabalhos parecem ser até mesmo mais longos do que sua duração real. Por que os artistas não vão direto ao ponto?
Acontece muito: entrar numa exposição repleta de vídeos e ficar com preguiça de se dedicar a todos deles ou achar uma videoarte interessante, porém “parada” demais para assisti-la por mais do que alguns minutos (ou segundos…). Por mais que nem todas os trabalhos em vídeo sejam assim – muitas vezes, eles têm uma narrativa clara e provocam a curiosidade para esperar seu fim – vários videoartistas preferem fazer trabalhos lentos, sutis, plásticos e sem uma história clara. Por que eles não vão direto ao ponto?

Video-instalação Arquivo Romance, de Dias & Riedweg, na exposição individual da Galeria Vermelho, em abril de 2018 (Foto: Julia Flamingo)
A arte é um jeito de tirar a pessoa de sua própria realidade. Seja dentro de um museu, galeria, cinema ou teatro, a ideia é que o espectador deixe pelo menos em parte sua lógica cotidiana e contemple uma nova experiência. Um caminho para isso é mudar a relação de tempo entre o visitante e o lado de fora e de dentro do espaço de arte. Ou seja, diminuir o passo e a aceleração para que um visitante mude a dinâmica do seu pensamento. Nesse sentido, pode acontecer de uma obra parecer se estender para além da sua duração no relógio.
EM CARTAZ
O tempo é a chave de exposições em cartaz em São Paulo como do americano Bill Viola, no Sesc Avenida Paulista; do franco-tunisiano Ismaïl Bahri (@_ismail_bahri_), no Espaço Cultural Porto Seguro; ou um filme do mineiro Cao Guimarães (@caoguimaraes), diretor de longas como O homem das multidões e o recém-lançado Espera (título bem sugestivo). Nestes casos, os artistas não se dedicam a transmitir narrativas, mas a compartilhar seus olhares apurados com o visitante e oferecer a possibilidade de reparar em feições, gestos e formas que passariam despercebidos se o foco fosse a fala ou a narrativa.
O americano Bill Viola, que ganhou a belíssima individual Visões do Tempo, vai ainda além: em seus vídeos, ele escancara o ciclo da vida em imagens em câmera lenta colocando seu espectador literalmente de cara com a passagem do tempo. Por exemplo: no trabalho Homem em busca da imortalidade/mulher em busca da eternidade, um senhor e uma senhora nus procuram marcas de doença em seus corpos (as imagens de altíssima qualidade são projetadas em duas placas de granito, como se fossem lápides). Ali, o tempo está presente na duração do próprio filme, na câmera lenta, nas rugas dos corpos, nos cabelos brancos, no movimento lento, nos momentos que o visitante gasta como espectador e na vida do espectador que está, também, passando.
DÊ TEMPO AO TEMPO!
Em sua palestra no Sesc Vila Mariana, no dia 17 de maio, Cao Guimarães resumiu: “Em Hollywood você não vê uma única cena sem fala. A vida não é assim. Isso separou muito o cinema da vida. E o que eu quero é aproxima-los”. Por isso: dedique tempo a uma obra antes de comentar que arte contemporânea é difícil demais, que não entendeu ou que não gostou. Afinal, ela está muito mais próximo da sua realidade do que você imagina!
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